Há uma ideia erradíssima sobre o cinema português - e é caso para dizer que o cinema português sempre pareceu sofrer disto: das "ideias" que se têm dele e menos da realidade que é a sua (que essa sim, por ignorância ou por alheamento, parece escapar aos juízos imediatos e estereotipados) - que avança que os seus agentes (realizadores, produtores, actores, argumentistas, sei lá) passam o tempo e a vida à espera do subsídio à sombra da bananeira e a fazer tudo por tudo para tirar gente das salas de cinema.
Pode haver casos em que tal aconteça e não temos dúvidas que boa parte dos equívocos entre os criadores e as audiências estão hoje enraizados numa espécie de resistência natural entre uns e outros, mas a verdade é que o desejo de fazer cinema, em suma, de fazer filmes e contar histórias anda por aí e os mais desatentos não podem julgar tudo pela mesma bitola só porque o discurso contra o cinema nacional se tornou uma "moda crónica" das mesas de café. Isto para dizer só o seguinte: há bons e maus filmes, bons e maus realizadores, uma evidência tão natural no nosso país como na indústria americana.
O problema é que isto impede-nos, a nós portugueses, de distinguir a qualidade da mediocridade. É uma derrota à partida que todos aqueles que lutam para produzir e estrear filmes não merecem. O artigo do Público de hoje, intitulado "O cinema português nunca existiu tanto e com tão pouco" (bem ao estilo da jornalista Inês Nadais) mostra-nos afinal que há gente no cinema português a fazer por ele. O cinema português não é uma abstracção: tem virtudes e defeitos, precisa de soluções e criatividade, de dinheiro e imaginação, e essencialmente de público. De ser visto. Era bom que começássemos por aí, de uma vez por todas.
Imagem: Trás-os-Montes (1976) de Margarida Cordeiro e António Reis
Imagem: Trás-os-Montes (1976) de Margarida Cordeiro e António Reis