sábado, 10 de outubro de 2009

2001: Odisseia no Espaço


Rever 2001: Odisseia no Espaço nunca é apenas uma revisão, é acima de tudo uma revelação, permanente e renovadora. E sim, há sempre novos pormenores: um gesto que nunca víramos anteriormente, uma cena que não havíamos apanhado (total ou em parte, literal ou metafórica), uma peça que encaixa na outra; essencialmente peças que encaixam umas nas outras e que à primeira vez, por desatenção, por incúria nossa, por um adormecimento da alma ou mera preguiça mental, não havíamos sido capazes de dispôr na sua lógica natural. Mas a obra-prima de Stanley Kubrick é um filme onde há muitas peças (imensas) e onde o puzzle acaba por constituir persistentemente uma coisa diversa daquela que víramos antes - o que faz de cada olhar nosso sobre aquelas imagens um processo inaudito de descoberta, uma viagem de estimulante transformação, uma experiência visual e mística, vá lá, para utilizarmos as frases mais recorrentes e comuns que normalmente lhe estão associadas.

Eu continuo a perceber que não percebo nada daquilo (apesar de ter a minha teoria: este é um filme sobre Deus e a sua relação com o Homem, mas também um filme sobre o lugar que esse Deus ocupa na nossa vida e existência e que é esse lugar que dá origem aos lugares para onde caminhamos como espécie em permanente evolução, mas isto é um pensamento - ou um julgamento - que tal como a sua linha de raciocínio se perde numa verdadeira espiral de sugestões, crenças e visões, e corre mesmo o risco de ser vítima da pressa dos seus entusiasmos). Ou ainda: que o menos importante ali é tentar perceber seja o que for, mas procurar sentir aquilo que se sugere, aquilo para o qual possa mesmo não existir uma definição verbal; o intangível, o não-dito, o não-visualizável. E sei que é um filme onde o cinema e a vida, a fé e o poder das imagens, a existência e o tempo, se confundem como em mais nenhum outro. E sublinho: em mais nenhum outro filme da História do Cinema. Quando o vejo, julgo que é isso que procuro: sentir-me fora do tempo, da existência, do corpo desta vida e da vida deste corpo, fora de tudo e de nada para assim estar mais dentro do mistério que somos.

Julgo que um velho amigo cinéfilo meu tem aquela que é até à data a melhor descrição que se pode ter deste filme: "vi, não percebi nada e gostei tanto". Estou com ele.

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