domingo, 18 de outubro de 2009

O caso Polanski


Não sei quem é culpado no chamado caso Polanski e até admito que possa não haver culpados nesta história com mais de 30 anos - e cujos contornos nunca conheceremos na sua autêntica dimensão pois só dirão realmente respeito aos dois que nele se viram envolvidos. Também não estou aqui para fazer qualquer tipo de juízo moral (Deus me livre, fujo disso como o diabo da cruz) nem para aditar à controvérsia fácil qualquer forma de julgamento público (outra coisa feia de se fazer quando não se tem um conhecimento concreto dos factos que ocorreram e muito cómoda para quem a pratica sentadinho nas esplanadas de café). Os conceitos de moral e culpa, como sabemos, oscilam muito de um lado e do outro do Atlântico (céus, até do lado de cá e de lá da rua a coisa muda, quanto mais), razão só por si suficiente para me abster de definir em favor de outros tão complexas fronteiras, e que mesmo hoje continuam a não satisfazer inúmeras consciências.

Agora sei que há vítimas, tal como sei que há meninas de 13 anos que são mais do que "meninas de 13 anos" (sempre as houve e sempre as haverá) e "realizadores" que nunca deixaram de beneficiar do facto de serem realizadores para atingirem propósitos diferentes à mera realização de um filme (ou a uma sessão de fotografias como foi o caso). Contudo, e segundo podemos ver no documentário Roman Polanski: Procurado e Desejado de Marina Zenovich, o caso Polanski depressa se esqueceu das suas "vítimas" - essencialmente esqueceu-se sequer de perceber quem era a "vítima" ou até se ela existiria - para se tornar no objecto de uma outra perversão: a voragem dos media à roda de um caso, e sobretudo de uma figura pública, cuja vida e percurso consistia igualmente um "filme" pontuado pela tragédia e pelo êxito - é preciso não esquecer que Polanski, além de ter sobrevivido ao Holocausto e à perseguição nazi que vitimou a sua mãe, viu ainda a mulher e actriz Sharon Tate brutalmente chacinada pelos elementos do grupo satânico comandado por Charles Manson, já depois de ter conquistado Hollywood e tornar-se um realizador consagrado.

Talvez por isso, consiga compreender que um homem que sobreviveu a Hitler e a Manson tenha pressentido que o palco em que o seu julgamento se tinha tornado não era mais do que uma nova forma de "execução" que muitas vezes, e hoje talvez mais do que nunca, insiste em romper com o sentido de uma genuína justiça (como nos linchamentos do Velho Oeste, diríamos). Repito; não sei se Polanski é culpado, e muito menos estou aqui na tentativa de inocentá-lo, mas sei como os carrascos são muito rápidos e agéis a aparecer nos momentos em que a oportunidade convida: e isso assusta-me mais do que qualquer pormenor sórdido na vida do cineasta polaco. Polanski, melhor do que ninguém, teria o faro para os detectar.

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