E ao segundo capítulo do ciclo O Cinema Vai à Ópera temos Farinelli de Gérard Corbiau (é hoje, no Cine-Teatro de Alcobaça, pelas 21h 30), um retrato do mais famoso cantor castrato de sempre: Carlos Maria Broschi, por muitos considerado como a maior voz de todos os tempos. Uma voz conquistada não sem um profundo sacrifício físico: Broschi, tal como era hábito na época, foi castrado na infância no sentido de manter a pureza e a qualidade do registo vocal que desde tenra idade o anunciava como um dos maiores talentos a passar alguma vez pelos palcos.
Além do seu percurso artístico e da convulsa relação com o seu irmão, o compositor Riccardo Broschi (a quem Farinelli entregava as conquistas sexuais que não podia consumar), o filme do belga Corbiau sublinha precisamente o carácter deste tipo de concessão à arte elevada ao seu mais alto extremo (e onde a mutilação se define como símbolo perturbador). Mais: neste quadro vemos ainda Haendel, o famoso compositor germano-britânico que acabou por compor algumas das peças barrocas que melhor fizeram ressaltar a voz de Carlos Maria Broschi, caso da ópera Rinaldo e da ária que acima evocamos (retirada precisamente de uma das sequências mais memoráveis da película); Lascia Ch'io Pianga.
Nota: não existindo, naturalmente, qualquer gravação da voz de Broschi (não esquecer: estávamos no séc. XVIII), os produtores de Farinelli resolveram-se por uma solução que mostra até que ponto o registo do artista se mostrava inatingível. Só unindo a voz da soprano Ewa Małas-Godlewska e do contra-tenor Derek Lee Ragin se conseguiu, de certo modo, garantir a qualidade "angelical" e etérea que exprimia. Se os anjos não têm de facto sexo, Farinelli terá sido a voz mais próxima a estar perto deles.
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