segunda-feira, 18 de maio de 2009

Zha Lai Nuo Er


Jalainur é a segunda longa-metragem de um jovem cineasta chinês: Ye Zhao, que ao que consta nem terá sequer chegado aos trinta anos (e já vai coleccionando prémios por vários festivais: o último foi mesmo o Indie Lisboa onde acabou por vencer o Prémio de Distribuição). Um filme profundamente "visual", que capta com especial devoção a paisagem mineira de Jalainur e a linha de comboio "apensa" onde velhas locomotivas fumegantes (e o "fumo" funciona aqui praticamente como uma personagem, mas já lá vamos) transportam vastos vagões de carvão (indispensáveis, imaginamos, à voracidade energética dessa potência galopante que nos últimos anos construiu a reputação económica da China). Um filme que retrata não só uma história de amizade entre um velho maquinista e um sinaleiro de via-férrea, mas a dor da sua ruptura, motivada pela reforma do primeiro.

Começámos por mencionar a forma como Ye Zhao nos devolve aquela paisagem agreste, inóspita e por vezes opressiva (a mina situa-se na cidade de Manghouli no interior da Mongólia), e contudo tão bela, sedutora e hipnotizante, capaz de engolir o corpo frágil do indivíduo e ao mesmo tempo de nos sugerir uma dimensão absolutamente poética daquele lugar no mundo. Tudo isto rima naturalmente com a separação das duas personagens principais e com a ausência que fica junto de cada uma delas; uma dor muda, frágil, mas desassombrada, sem vestígios de culpa nem remorso (se há coisas que parecem ficar por dizer é isso mesmo que torna o filme ainda mais sedutor), pacificada, por muito estranho que isto nos pareça (e parece-nos).

Outro aspecto relevante desta obra está na atmosfera "vaporosa" que impregna a história ou, sem subterfúgios, a obsessão que o realizador mostra em relação ao "fumo": se há uma terceira personagem por aqui é esta. Está em todo lado: nas nuvens de fuligem e vapor que sobem das chaminés das locomotivas, nos jactos que assobiam debaixo das rodas de ferro, nas baforadas de cigarro daqueles homens que encontram no tabaco uma pausa, no próprio bafo da respiração humana. Como se Zhao Ye filmasse apenas locomotivas mesmo quando filma os trabalhadores.

Sim, como dizia na sinopse avançada pelo Indie, há uma precisão quase documental (à semelhança de muitos cineastas da sua geração) na abordagem a esta China moderna, rasgada pela industrialização e pela dimensão precária do universo do trabalho. No entanto, vemos uma pequena diferença: a fragilidade daqueles seres em contraste com a dureza da paisagem origina um milagre que é da ordem da esperança (uma esperança que nos surge fundada na lenta passagem do tempo e da vida) e que não deixa amargura (nós, pelo menos, não a guardámos). Algo que vem também acompanhado por uma deliciosa partitura musical composta por Lin Chaoyang (um nome que vamos reter com atenção), a pontuar a narrativa em momentos-chave (mais em jeito de interlúdio e menos como "bengala" das imagens). Ou seja, Zhao Ye encontra beleza onde outros, muitas vezes, só vêem desespero. O que não deixa de ser uma afirmação interessante no contexto geracional onde surge. Contas feitas: Jalainur é um filme belo (quando nos perguntarem o que vimos nele, será isso que diremos).

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